Como não lembrar do Oscar 2017 que deu o Oscar para Moonlight? Foi simplesmente uma das gafes mais vergonhosas da história da Academia e que não vai sair do conhecimento popular tão cedo.
Aliás, muitos só lembram de Moonlight por causa da gafe e menos pelas qualidades do filme, o que é injusto, pois o longa de Barry Jenkins é excelente.
Neste cenário, não eram poucas as expectativas para seu novo filme. Se a Rua Beale Falasse, baseado no romance homônimo de James Baldwin, também toca na temática racial, mas com o pano de fundo um pouco diferente: temos aqui uma história de amor e uma amostra de que este sentimento passa por cima de tudo, inclusive do racismo.
A história se passa no Harlem dos anos 70, onde a nossa protagonista Tish (Kiki Layne, excelente no papel!) luta para livrar o marido, Fonny (Stephan James), de uma injusta acusação de estupro.
A trama pode parecer simples – e é simples – é uma história de amor, onde um casal se conhece, ele é preso injustamente e esposa vai defende-lo, mas o roteiro bem amarrado de Barry Jenkins usa essa trama para explorar o racismo da época e da região e o feminismo, afinal, se já era difícil para um homem negro em um país segregado, imagina para a mulher negra.
Nisso, a nossa protagonista se sai muito bem como atriz, como personagem e sua luta não é muito diferente de milhares de mulheres no mundo inteiro: ela tem que lidar com o preconceito da família de seu marido, que torce contra o casamento, além dos problemas da gravidez, na luta pela inocência e ainda ter que sustentar a casa.
Mas nada disso funcionaria se a atriz não funcionasse: Kiki Layne é desconhecida, mas pode ter neste filme a chance do estrelato. Sua Tish é uma personagem amargurada, triste, porém, cheia de esperança. E tudo isso é visível no olhar e expressão de sua atuação.
O filme pode lhe abrir as portas.
O mesmo também podemos dizer de Stephan James (visto recentemente na série Homecoming) que tem tudo – e mais um pouco – para uma carreira em Hollywood.
Mas Se a Rua Beale Falasse está sendo mais comentado nesta temporada por conta dos prêmios dados à Regina King como Atriz Coadjuvante, interpretando a mãe da protagonista, Sharon.
Seu papel é mais convencional do que o esperado e ao sair do filme, o espectador se lembra de tudo, menos de sua performance.
Não que ela esteja mal no papel, pelo contrário, mas os prêmios recebidos por ela soam exagerados quando vemos o filme, sendo uma personagem mais “normal” do que poderia ser, sendo a mãe de uma mulher nessas circunstâncias e sem um momento para chamar de seu no filme.
Do segundo para o terceiro ato do filme, há um rumo do roteiro que indicava que a personagem Sharon teria um momento e que justificassem os prêmios, mas que ficou só na promessa.
Aliás, todo o elenco coadjuvante está desperdiçado aqui: há personagens que aparecem e somem sem explicação, como os envolvidos com a prisão de Fonny, como o policial e a acusadora e a família dele, que aparece em uma grande cena, logo no primeiro ato, mas que inexplicavelmente some da trama (mesmo com o personagem passando parte do filme atrás das grades).
Além do mais, o filme perde muita força em seu terceiro ato, ficou claro que Barry Jenkins resumiu seu roteiro e que no livro há muito mais camadas da história.
Mas apesar dessas ressalvas, os pontos positivos de Se a Rua Beale Falasse são muito mais evidentes: além do já citado casal principal e de sua trama racial, o filme apresenta a parte técnica quase que irretocável, seja por sua maravilhosa trilha sonora de Nicholas Britell (indicado ao Oscar e também compôs a trilha de Vice, que também está no Oscar).
Além disso, sua Montagem, intercalando presente e passado, também merece destaque, além da reconstituição de época e sua fotografia com cores quentes do Diretor de Fotografia James Laxton (também de Moonlight).
Se a Rua Beale Falasse é um trabalho muito competente de Barry Jenkins, mostra que Moonlight não foi apenas sorte e que ele pode aprimorar ainda mais seu talento na direção.
Falta muito para seu próximo filme?