To Hero

N.A: Pronto, esse é o próximo post, hehe. E vamos ao que interessa \o/

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Seus pés estavam adormecidos por conta do frio e Zero andava no encalço do homem que o salvara. Ele tinha que se lembrar de perguntar qual era o nome dele.

Zero ficou ainda mais impressionado com o que viu ao voltar para onde antes fervilhava uma guerra civil. Olhando para o chão pôde reconhecer, com satisfação enorme, que a maioria dos homens caídos eram Yudenianos, embora pudesse ver alguns homens, mulheres e crianças também, conhecidos.

Algumas mulheres andavam com facas de cozinha nas mãos e rolos de massa, qualquer coisa servia como arma. Pedaços de canos, talheres, pedaços de pau, até garrafas quebradas.

Parecia-lhe impossível que toda aquela gente reprimida por tanto tempo fosse capaz de derrotar tantos Yudenianos. Por mais que os civis já tivessem matado, sua raiva voltou a borbulhar quando viram o grupo trazendo Ivan. Alguns avançaram para cima dele, xingando-o de todos os nomes possíveis, cuspindo e amaldiçoando-o por tudo o que o vilarejo vinha passando.

Algumas pessoas do grupo afastaram os civis; eles queriam que ele respondesse a algumas perguntas, não ajudaria em nada se ele estivesse morto, embora Zero quisesse matá-lo com as próprias mãos.

– Vocês nos salvaram – clamaram no meio da multidão.

– Quem são vocês? – uma voz grave perguntou.

– Somos os Inimigos do Mundo! – alguém do grupo exclamou.

Não demorou e o nome do grupo começou a se espalhar como um novo grito de guerra, revigorante e vitorioso. Punhos estavam estendidos no ar, saudando-os enquanto gritavam em plenos pulmões.

Zero percebeu que o grupo se dirigia a uma estalagem quando eles já estavam bem longe. Achou que não deveria entrar, por mais que quisesse, então ficou do lado de fora, tremendo. Sentou-se na pequena varanda, encolhido, repassando na cabeça tudo o que havia acontecido hoje. Agora ele pensava no que faria a seguir, não tinha mais sua família, todos haviam sido mortos, não tinha mais um propósito ali.

Alguém tocou seu ombro e Zero sobressaltou.

– Desculpe – uma garota se ajoelhava na sua frente, carregava um embrulho nas mãos. Ele não podia ver cores, mas sabia que aquilo que lhe escorria pelo queixo era sangue.

A garota não devia ter mais do que quinze anos e estava retraída, qualquer pessoa que se aproximasse demais fazia com que ela se assustasse, assim como ele.

– Trouxe roupas – ela disse, estendendo o embrulho, quando Zero não aceitou ela estendeu uma mão – Sou Margot – disse, pegando a mão dele, chacoalhando-a timidamente e depois, novamente, ela estendeu o embrulho. – Você deve estar com frio.

Zero aceitou o embrulho, ainda desconfiado. Levantou-se devagar e procurou um lugar para se trocar, achando que seria muito inconveniente se escolhesse fazer isso dentro da estalagem.

Andou pela rua, a cabeça baixa enquanto abria caminho até onde era sua casa. Fez o caminho de volta, para onde o grupo tinha capturado Ivan. Seu coração se apertou quando parou na frente de sua casa, as janelas estavam quebradas e a porta estava aberta e quebrada, tinha sido arrombada havia muito tempo. Entrou na casa escura, revivendo cada detalhe de quando tinha sido tirado dali a força, revivendo cada cena de quando sua família foi assassinada na sua frente.

Acelerou o passo fazendo o caminho que conhecia até seu quarto. Palha estava espalhada no chão e a janela estava escancarada. No assoalho ele podia ver alguns flocos de neve.

Um pedaço de pano velho serviu como esponja. Era tortura lavar o corpo com água naquele frio, mas para quem havia sido torturado por duas semanas, não era tão ruim assim, pensou. Não tinha tempo para um banho, nem vontade também. Vestiu a roupa que Margot havia lhe dado, descobrindo que estranhava o conforto do tecido encostando-se à pele. Colocou as botas e jogou o manto simples em cima dos ombros. Resistiu ao impulso de dar uma volta dentro da casa simples. O remorso que sentia sem reviver todas as lembranças já eram o suficiente. Passou pela porta a fora e respirou fundo.

Não tinha a menor ideia do que faria a seguir, era óbvio que a paz não duraria muito. Os Yudenianos saberiam que tinha alguma coisa errada quando outro destacamento viesse ou quando vissem que nenhum deles estava voltando. Tennes estava condenada, de uma maneira ou de outra. Embora ele quisesse ajudar, não podia fazer nada ali. Pensando bem, não podia fazer nada lá fora também.

Em vez de voltar para onde o grupo estava ele foi até onde eles encontraram Ivan. Zero andou cautelosamente, esperando que a criatura da tormenta já tivesse morrido àquela altura, mas quando chegou lá, não viu sinal dela, e não sabia dizer se isso era bom ou ruim. O gigante jazia ali, seu tamanho colossal já não fazia diferença. Aproximou-se de onde o elfo estava e encontrou algo no chão.

Abaixou-se para ver melhor, era um arco, um arco duplo para ser mais exato.

Aproximou a mão da arma vagarosamente, temendo que ela fosse tão exótica quanto o dono, mas nada aconteceu quando ele a tocou.

Seus dedos correram pela madeira, lembrando-se de seu primeiro arco, seu primeiro tiro. Dedilhou a corda rígida e puxou-a, testando. Definitivamente era um bom arco, não era o seu, mas era bom. Não sabia exatamente o que estava pensando quando pegou a arma e a única flecha que o elfo tivera a chance de atirar.

Andou vagarosamente de volta para a multidão que ainda gritava o nome daquele grupo que os salvara, colocando o arco às costas, balançando a única flecha nos dedos.

Aproveitou sua caminhada. Podia sentir suas pernas, nada mais doía, não haviam feridas em seu corpo, ele podia ver.

Algumas pessoas recolhiam corpos do meio da rua, alguns aproveitavam para saquear os soldados caídos. Os que ainda respiravam ganhavam uma punhalada da população raivosa.

Na varanda havia mais gente do que antes. Havia dois garotos do lado de fora e também uma menina, aquela que lhe dera a muda de roupa. Quando Zero chegou mais perto, um outro garoto saiu de lá de dentro e passou esbarrando em seu ombro, a testa franzida e o lábio inferior proeminente, ele parecia prestes a chorar.

Não muito tempo depois, o angelo saiu, batendo a mão no batente da porta. Ele não parecia zangado, só frustrado. Suas asas estavam fechadas, mas ainda assim eram enormes.

Zero podia ouvir vozes lá dentro, mas foi por pouco tempo. Ouviu o arrastar de uma cadeira e se afastou da porta, esbarrando nos dois garotos no processo por conta do espaço pequeno.

Braços fortes empurraram Ivan para fora e, aos poucos civis pararam tudo que estavam fazendo.

– Matem ele! – gritou uma voz de mulher.

Não houve hesitação por parte de ninguém. A multidão avançou em cima do homem, e Zero pôde ouvi-lo gritar dolorosamente mesmo depois de ter sumido no meio do povo enfurecido.

Não podia dizer que não estava horrorizado com aquela cena. A população lincharia

Ivan até que estivesse morto.

– Vamos – ouviu a mulher dizer. Seus cabelos encaracolados lhe cobriam o rosto, mas ele não precisava ver para saber que ela não aprovava o que tinham feito.

Quando Zero viu os meninos e a garota se precipitarem para dentro, ele fez o mesmo, pois, por mais que odiasse Ivan, pensava que aquela era uma maneira horrível de morrer.

Estavam todos na margem do Rio dos Deuses agora. Aqueles garotos que esperavam do lado de fora da estalagem estavam agora conversando com o grupo de aventureiros. Zero não demorou a perceber que os garotos tinham alguma ligação com eles.

Em poucos minutos todos haviam se apresentado. O nome do homem que o salvara era Oromis, paladino de Thyatis. Isso explicava porque ele dera as costas aos seus amigos para curá-lo. Era um homem alto e forte e de cabelos curtos, o que era bem incomum para os elfos.

O mago que tentara controlar o elfo corrompido se chamava Vergnett e era o único mago do grupo. Magro e de estrutura frágil, ninguém imaginaria o poder que tinha. Também era um elfo, escondia-se por trás de um capuz. Zero não o conhecia bem, mas parecia bem calado, mas não de um modo tímido e sim pensativo, perigoso.

Cygnus era um clérigo de Nimb, como suspeitara desde o início. Tinha uma capa com o símbolo Yudeniano nas costas, amarrado de cabeça para baixo, um grande insulto. Riu por dentro quando o viu pegar a capa de volta de um das guerreiras que se disfarçara de oficial para conseguir passar pelos guardas nos portões.

A mulher que tinha ajudado a trazer Ivan era realmente muito grande. Usava uma armadura pesada e seus músculos apareciam pelas fendas da armadura, embora fossem delicados, davam medo. O punho de sua espada de suas mãos amarrada às suas costas era visível para qualquer um. Realmente era preciso muita força para conseguir manejar aquilo. Era difícil vê-la sorrindo.

Lyra parecia ser a mais nova de todas as mulheres. Tinha o cabelo totalmente embaraçado em grandes nós, mas ainda pareciam bonitos. Também era alta, e carregava duas espadas, uma longa e outra curta. Era menos bruta do que a outra. Suas orelhas eram levemente mais pontudas do que orelhas normais, era uma meio-elfa.

Ayla parecia ser a única mais arrumada entre as mulheres, seu cabelo parecia recém-lavado, somente com algumas mexas fora do lugar. Seu corpo esguio e delicado lhe dizia que ela não era uma guerreira. Carregava um florete na cintura e uma besta na bota, mas Zero desconfiava que essas não eram suas únicas armas (sabe-se lá quantas armas ela escondia dentro daquele espartilho). Era muito boa em desconcentrar, principalmente os homens. Mesmo não enxergando como uma pessoa normal ele sabia que a beleza daquela mulher não era igual a qualquer outra. Fechou a boca fazendo um barulho estranho quando seus dentes se chocaram uns contra os outros. Engoliu em seco, percebendo que estava sendo muito óbvio.

O outro homem era estranho. Chama-se Miguel e pelo que lhe contara, não se lembrava de onde viera. Suas asas ocupavam um bom espaço por onde quer que andasse. Era muito alto e musculoso e, embora estivesse frio, ele estava vestindo uma toga e parecia não sentir os efeitos do vento gelado vindo das Uivantes. Se sentia, não demonstrava.

Havia um outro grupo junto com os aventureiros. Eram civis que vinham de Yuvallin, mas eles gostavam de ser chamados de milicianos. Todos eram muito novos, o mais velho devia ter não mais do que 16 anos. Margot estava entre eles e não abria a boca senão para admirar o angelo.

Zero descobriu que os aventureiros seguiriam viajem direto para as Uivantes, o que era loucura, pelo menos com um grupo tão grande como aquele. Alguém teve que dizer que os garotos não poderiam ir junto e eles não ficaram nada felizes, principalmente o líder – Bran era o nome dele, lembrou-se. O menino ficou carrancudo, mas não quis demonstrar uma reação infantil.

Olhou para trás novamente, para os portões pensando no que faria. Olhou para o arco em sua mão e levou a outra para sentir as penas das flechas em sua aljava reabastecida. O que ele tinha a perder?

– Ahn…com licença – disse, timidamente, infiltrando-se no meio dos milicianos.

Zero geralmente não era tímido, mas sabia que estava lidando com gente com bem mais experiência. Em seus trinta anos, ele não tinha vivido metade do que aquele grupo tinha em experiência de combate.

Mexeu na venda automaticamente, nervoso. Depois que toda a confusão acabara do lado de fora, quase nada restara de Ivan, mas Zero avistou um pedaço rasgado de sua capa roxa, que antes significava sua posição na hierarquia, agora era apenas sua mortalha, a coisa mais digna que poderia ter. Pegou o farrapo do chão e amarrou em volta da cabeça logo em cima das pálpebras, afim de cobrir as órbitas fundas e vazias.

Um silêncio profundo emanou durante um tempo, enquanto todos paravam de conversar e voltaram sua atenção para o homem não tão cego assim. O zumbido do silêncio só era cortado pelo Rio dos deuses.

– Eu…eu quero ir com vocês – disse. Depois percebeu como sua manifestação era estúpida. Se não levariam os milicianos, por que levaria ele?

– Como? – Lyra perguntou, um sinal de riso na voz.

– Posso ser útil. – começou – Sou bom com o arco e flecha – falou ansiosamente, apertando a madeira nas mãos.

Ayla se aproximou, tinha uma maçã meio mordida nas mãos.

– É mesmo? – seu tom era desafiador.

Zero tinha aberto a boca para responder quando Ayla jogou a maçã para cima. Era como se voltasse á adolescência, quando era sua irmã quem fazia isso.

Sua mão livre foi direta e automaticamente para sua aljava, pegando três flechas de uma vez. Encaixou-a no arco, cada dedo separando uma flecha e cada uma postada mais para frente do que a outra. Atirou assim que a maçã começou a cair.

Suas flechas foram certeiras, todas acertaram a maçã, a primeira trespassou o miolo e terminou espetada na margem do Rio dos deuses a uma bela distância, e as outras duas se fincaram um pouco mais à esquerda. A terceira flecha partiu a segunda, pois acertaram exatamente o mesmo lugar. Continuou com o braço erguido quando a maçã caiu. Ele mesmo não acreditava que ainda fosse tão bom com o arco. Começou a sorrir para si mesmo, então notou o novo silêncio.

Todos estavam espantados. Olhou para os lados e viu seus vizinhos, alguns sorriam, outros arregalavam os olhos. Olhou para Ayla, abaixando os braços lentamente.

O sorriso da moça o fez adivinhar a resposta.

– Tudo bem então – Ayla voltou-se para o grupo e depois de algum tempo eles entenderam que ela queria uma resposta.

Todos acenaram com a cabeça de forma veemente.

Então era isso. A partir daí, Zero passara a fazer parte dos Inimigos do Mundo.

Embarcou na balsa, ainda digerindo a informação. Começara o dia como prisioneiro e agora era um aventureiro. Se tornaria um herói.

No meio de tudo isso, ele faria o possível e o impossível para manter-se leal a Oromis e protegê-lo a qualquer custo. Sentia que devia mais do que sua vida àquele homem, talvez fosse impressão, mas era quase como se tivesse criado uma ligação empática com o paladino. Seria uma espécie de guarda costas.

Ayla passou na sua frente, andando graciosamente posicionando-se ao lado dele, olhando por sobre a amurada.

Seria uma travessia perigosa, a correnteza do Rio dos Deuses era quase tão poderosa quanto os seres divinos em si, pegava o barco perpendicularmente. Uma corda atravessava a balsa da popa à proa passando pelo meio de dois anéis. Era possível ouvir o material da corda esticando-se, lutando contra a corrente. Mas isso não era nada comparado com os perigos que aquelas águas escondiam, ou nas terras do outro lado.

Alguns homens conhecidos subiram a bordo e pegaram nos remos, prontos para

fazerem o barco andar.

Viu seu vilarejo desaparecer aos poucos conforme a balsa ganhava velocidade com o ritmo cadenciado dos remos no convés abaixo. Viu desaparecer seu passado e sua arrogância.

Agora seria um herói.

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N.A:  E chegou ao fim…ou será que não?

That’s all folks. Espero que tenham curtido. Até a próxima aventureiros 😉

Nerd: Beatriz Napoli

Devoradora de livros, publicitária apaixonada, tem dois pés esquerdos e furtividade 0 para assaltar a geladeira de madrugada. Se apaixona por personagens fictícios com muita facilidade, mas não tem dinheiro para pagar o psiquiatra que obviamente precisa.

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