Shingeki no Kyojin ou A Loucura Japonesa em Toda sua Glória

Em algum momento da minha vida, lá atrás, na adolescência, fui otaku. Ou um nerd de animê mesmo, já que nunca fiz cosplay. Tentava acompanhar de tudo, e parte da minha criação se deve a brilhantes pérolas como Cavaleiros do Zodíaco, Dragon Ball Z, Sailor Moon, Evangelion e meu preferido entre todos: Yuyu Hakusho. Este último formou caráter.

Mas lá pelos dezoito anos, com a faculdade e “carreira” em mente, aos poucos parei de acompanhar o cenário da animação japonesa, que eu tanto amava.  Naruto e Gantz foram sobreviventes, mas não dava mais para suportar milhares de episódios. Tentei One Piece, mas quando calculei o quanto da minha vida seria roubada, desisti depois do quinquagésimo episódio. Fiquei nos mangás. Ai parei de comprar. E as vezes acompanho online.  Faz parte, por uma equação de prioridades e interesses da vida, algumas coisas continuam, outras não.

Eis que vadiando pelas marés das internets, vejo aqui e acolá comentários, críticas, menções e palavras perdidas sobre um tal “Ataque aos Titãs”. Ai surgiu um comercial japonês mostrando uma pequena versão live-action do desenho. Fui ver a abertura. Li uma crítica no Kotaku. Vi que tinha no Netflix americano. Fui fisgado, porque quando reparei em sua existência, nunca na minha vida surgiram tantos “WHAT THE FUCK” mentais como uma revoada de pombas na praça da Sé.

A sinopse detalhada e mais completa vocês podem encontrar aqui, assim não me delongo muito em detalhes. O animê basicamente conta a história de três personagens em um mundo no qual os humanos foram encurralados em uma cidade murada pelos “Titans”, ou Titãs, gigantescos humanoides cuja principal função é mastigar humanos. A humanidade se encontra no limiar da extinção, porque eles são muito poderosos.

A sinopse já parece estranha, mas assistir a execução disso te deixa desconfortável. Os titãs são praticamente idênticos aos humanos, porém nus e com leves deformidades, deixando a animação sempre com um pé no terror. É difícil acreditar pela escolha “artística” já que ao mesmo tempo que são monstros a identificação também é possível pela fisionomia. Lembra do birthday dog? Pois é. Estranho.

Tenso

Fora isso, a animação não deixa de seguir os comuns clichês nipônicos. Por mais que você queira uma vida saudável, o miojo nunca sai de você:

1. Eren, protagonista, é o típico cabeça dura vingativo com “I have a dream” e um poder oculto (Yusuke, Naruto, Seya, oi). Desinteressante, chato mas obstinado, não pára por nada até alcançar seu objetivo: limpar a terra dos Titãs e libertar a humanidade.

2. Discursos e verborragia intermináveis para segurar um episódio de 22 minutos e continuar dentro do orçamento, prática comum de telenovela.

3. Tem o personagem sombrio e descolado (Vegeta, Hiei, Gary, Saito, olá pra todos vocês).

4. Estereotipagem feminina (porém muito mais amena que em outros).

5. Militarismo exacerbado.

Entre outros que eu poderia continuar listando. Mas tirando esses fatores, depois de assistir à primeira e única temporada (26 episódios), Attack on Titan me lembrou porque sempre achei a animação japonesa superior, no geral, à americana, mesmo sabendo que esse quadro é muito mais equilibrado hoje. Primeiro, a qualidade gráfica é insuperável. Só japonês sabe desenhar uma espada bem feita. Reparem em qualquer animação ocidental. Não sabemos desenhar espadas.

Ação espetacular e criativa. Pega aquela espada bem desenhada e invente o pior jeito possível de usá-la, mas crível e badass. Se já teve até animação que transformou ioiô e vara de pescar em armas de destruição em massa (Beijos Hunter X Hunter), nada é impossível.

A estrutura narrativa de sagas, com continuidade emparelhada com as melhores séries televisivas americanas (que adotaram com mais força esse modelo pós-Lost, lembremos, irmãos).  E com um benefício adicional: AOT parece ser pensada para ser uma série curta, nada de 300 episódios para comer uma coxinha e salvar o universo, e o enredo, apesar da minha sinopse preguiçosa, é intricado e cheio de mistérios absurdos que te mantém com os pelos ouriçados.

E, por último, a criatividade e ideias absurdas que jamais passariam com nenhum produtor/editor ocidentais. Sério, se ponha no lugar da pessoa que recebeu essa sinopse. Você sabe que não aceitaria. Eu não aceitaria. É um desenho meu Deus! “Uma elite de soldados homem-aranhas que lutam contra gigantes nojentos que não tem aparelhos reprodutores”. Sério mesmo?

Ao mesmo tempo, a série nunca perde a força emocional que impulsiona seus personagens e o contexto bizarro que vivem. Você torce por eles, chora com eles e luta com eles. Você se importa com aquela bizarrice toda. Mikasa, parceira do protagonista, é talvez o personagem mais interessante da história, por quebrar o estereótipo comum da donzela em perigo e fêmea inferior (Haruno Sakura, te julgarei pro resto da vida) e ter uma relação ambígua e que inverte gêneros óbvios com o protagonista.

Depois de tantos anos sem acompanhar animes, e com uma outra cabeça, pude perceber temas que me incomodaram e me deram um novo olhar sobre a cultura japonesa. Mesmo assim, Shingeki no Kyojin é um exímio exemplar do melhor da indústria cultural japonesa, com seus maneirismos e brilhos porém, principalmente, uma loucura embutida de que tanto sentia falta. A estrutura é muito similar a um primo distante e de muito sucesso, a série Gundam, mas tiram-se os robôs e colocam-se gigantescos humanoides horrorosos e uma maneira absurda de batalha aérea.

Não é pra qualquer um. Pra quem nunca viu animê na vida, a estranheza é gigante. Lembra a primeira vez quando você ouviu falar do ornitorrinco e isso te fez questionar se Deus existe? Pois é, vá com calma. Para os iniciados, pulem sem medo, prepararem seu equipamento de manobras 3D, lâminas afiadas e desliguem qualquer filtro mental sobre o que é sanidade.

Nerd: Novo Nerd

O projeto e a paixão de uma equipe de Nerds que gosta tanto de suas esquisitices que não consegue se conter. Afie sua espada, prepare seu golpe poderoso, pegue seus power converters e embarque nesta estrada, porque, meus amigos, “it´s gonna be Legen… wait for it… DARY! LEGENDARY!” - SO SAY WE ALL.

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