Geek & Game Rio Festival tem um (grande) futuro

Toda vez que se fala na produção de um evento que pretenda reunir fãs do universo Geek, confesso que olho com certa desconfiança. Desde os meus tempos do extinto ‘Programa Descontrolados’, frequento eventos dos mais variados possíveis. Muitos deles prometiam uma experiência multicultural, mas no final das contas, acabavam sendo apenas mais um daqueles eventos de anime, com as mesmas atrações de sempre. Então, depois de dar um restart na minha vida YouTuber, optei por ficar mais afastado desse tipo de evento, exatamente por estar cansado do mais do mesmo.

227983-fique-por-dento-de-tudo-o-que-vai-rolar-opengraph_1200-1No entanto, a convite do parceiro Carlos AVE César, aceitei cobrir a primeira edição do Geek & Game Rio Festival (GGRF), realizada entre os dias 21 e 23 de abril, no pavilhão 5 do Riocentro, aqui, no  Rio de Janeiro. Confesso que cheguei ao evento sem grandes expectativas, afinal, as últimas experiências em eventos me provaram que não adianta ir com elas tão em alta, pois a decepção é medida exatamente por essa altura.

Ao que pese a redundância do título do evento (afinal, o termo ‘Geek’ já engloba o seguimento gamer), a GGRF não foi exatamente o que eu esperava. Não foi mais um evento de anime mal organizado, transmitindo a falsa ideia de um evento voltado à cultura Geek, pelo contrário. Os elementos da cultura Geek estavam ali presentes, mesmo que de forma desproporcional em favor de atrações para gamers, mas ainda assim, ali estavam. O que faltou e quais foram os acertos? Vamos seguindo, ponto a ponto:

ORGANIZAÇÃO

O evento foi organizado pela Fagga- GL Eventos Exhibition, a mesma responsável pela Bienal do Livro do Rio de Janeiro, em parceria com a Supernova, especializada em e-sports. Temos aqui a união de dois times que possuem know how para executar a proposta da GGRF com precisão. Eles acertaram em tudo? Claro que não, isso é praticamente impossível. Mas é inegável que houve uma grande preocupação em oferecer, mesmo que de forma bem limitada, atrativos para o público desse festival.

Para o público em geral, dentre os quais eu permaneci bastante tempo imerso (ao invés de ficar observando o evento da janelinha da área de imprensa e mexendo no celular, como outras ‘mídias’ resolveram fazer), sem dúvida não haviam grandes queixas, a não ser, claro, pela distância do local escolhido para sediar o evento, dos demais pontos da cidade. Mas isso é papo para outro tópico. De um modo geral, tudo funcionou bem. Haviam membros da Staff em todos os cantos do evento, sempre solícitos, além de uma equipe de limpeza constantemente mantendo tudo livre de sujeira, diferente de outros eventos por aí…

Para quem estava realizando a cobertura do evento, no nível Blogueiros/YouTubers, notei alguns problemas pontuais, como por exemplo, a falta de indicação, pelos membros da Staff, de que havia um lugar reservado para nós pelo evento, algo que somente fui descobrir no segundo dia, através de um outro colega blogueiro.

Também notei uma falha no tratamento da cobertura dos painéis e palestras do Hiker Station. Havia um espaço reservado exclusivamente para a imprensa tradicional e suas câmeras poderosas; no entanto aos blogueiros e YouTubers e seus celulares e câmeras simples, nos restavam as áreas comuns, de trânsito do público, o que nos levou, por vezes, a sermos abordados por membros da staff, solicitando que saíssemos desses espaços, em busca de um lugar que não atrapalhasse a visão do público, o que de fato concordo, afinal eu não estava ali pagando R$ 100,00, mas quem estava, certamente queria ter a melhor visão do palco. Mas custava a organização do evento ter pensando nos blogueiros e YouTubers, reservando um espaço para que nós pudéssemos realizar a cobertura do Hiker Station sem atrapalhar o público? Fica a dica para a próxima edição, Fagga!

ESTANDES  E ATRAÇÕES

Por ter sido organizado pela Fagga, não foi muito de se espantar que a configuração do evento lembrasse o modelo já utilizado por eles na Bienal do Livro, mas aqui, em menor escala. Enquanto a Bienal costuma ocupar três pavilhões, a GGRF ocupou apenas um. Para um primeiro evento, até considero que foi espaço suficiente, mas no futuro, consideraria expandir para pelo menos dois pavilhões.

Havia uma grande variedade de estandes, trazendo desde grandes editoras, como a Leya e a Companhia das Letras até pequenas lojas geek, como a da Escola de Magia e Bruxaria do Brasil, focada no público Potterhead. Havia muito o que comprar, com preços bem variados, muitos até bastante acessíveis.

Mas para um evento Geek, cujo termo abrange fãs de “tecnologia, eletrônica, jogos eletrônicos ou de tabuleiro, histórias em quadrinhos, livros, filmes, animes e séries” (Fonte: Wikipedia), esperava que houvesse um maior balanceamento na oferta de entretenimento para o público. Haviam duas grandes editoras (citadas acima) e algumas outras menores, para atender ao gosto do público leitor, assim como haviam dezenas de estandes vendendo HQs, Action Figures, Funkos (bem caros, por sinal!), mas onde o público cinéfilo iria se encaixar? Certamente não era no trailer do Cinemark, que estava só vendendo pipoca ali (diga-se de passagem, até muito mais gostosa do que a que costumamos comprar nos cinemas da rede). Havia apenas um espaço, promovido pela Fox Film do Brasil, para divulgar o mais novo filme da saga Alien e mais nada além disso.

Se a coisa estava fraca para os fãs de cinema, o que dirá para os fãs de séries de tv? Essa tribo geek não possuía uma atração sequer, a não ser, claro que consideremos os estandes de vendas, mas não acho que isso conte exatamente como atração né? E os fãs de anime? Bem, não sei se eles se sentiram 100% representados, mas vi dezenas de cosplayers, desfiles num palco exclusivo (assunto do próximo tópico), além de uma grande variedade de estandes de vendas.

Para futuras edições, acho legal repensar a divisão das atrações, criando mais opções de integração para o público com o evento. Haviam estandes com atrações para fãs de tecnologia (como o vôo de asa delta virtual, promovido pela Zion) e de games (fliperamas, Just Dance e muitos outros estandes promovendo espaços para jogos), mas pouquíssimo se pensou em encontrar atrações para os Geeks de outras tribos. Para os fãs de literatura (ao qual me incluo, dá licença…), por exemplo, só restavam comprar alguns poucos livros (a variedade era bem escassa até mesmo nas editoras maiores, que adotaram a estratégia de trazer basicamente livros de fantasia para o evento) ou tirar foto no Trono de Ferro. E nada além disso.

COSPLAY AWARDS

LorelayUm dos espaços mais divertidos do evento foi o pequeno e quase escondido palco, dedicado às performances de cosplayers na GGRF. A apresentação chamava logo a atenção de quem passasse por ali, atraídos principalmente pelo carisma e simpatia com que a drag Lorelay Fox, do canal ‘Para Tudo‘, comandava a atração. Por ali passaram cosplayers profissionais e amadores, crianças, adolescentes e adultos, todos tratados com respeito, mas ao mesmo tempo muito bom humor, por Lorelay. Em pouco tempo, era fácil notar a aglomeração de uma pequena multidão para a companhar e vibrar com as performances no palco. Sem dúvida, o melhor palco cosplay que já tive oportunidade de acompanhar em um evento!

HIKER STATION

O espaço do evento dedicado aos painéis e palestras. Confesso que esperava um pouco mais desse espaço, mas para uma edição inaugural, achei ‘OK’.

Não havia muito conforto para o público aqui. Optou-se pelo uso de puffs e não cadeiras, que após algum tempo sentado, provocam certo desconforto, pela falta de apoio nas costas. Para um espaço de palestras, deveria ter sido considerado melhor o fator conforto. O som também foi bastante prejudicado, especialmente quando haviam disputas mais barulhentas no Gamer Station, cuja locução e gritos do público, prejudicavam  o áudio vindo do palco do Hiker Station. Se a configuração de um palco aberto for mantida para futuras edições, seria interessante localizá-lo em um pavilhão livre de barulho excessivo provocado por outras atrações.

Sobre a programação, em cada dia o evento trouxe uma atração internacional: o  designer de games Tim Schafer (21/04), o produtor de ‘Mad Max: Estrada da FúriaIain Smith (22/04) e Chritie Golden (23/04), autora de livros livros inspirados nos universos World of Warcraft, Star Trek e Assasin’s Creed. Dos três, apenas achei interessante a presença de Tim Schafer, pois, do ponto de vista literário, Christie Golden foi irrelevante para mim. E como não sou fã de games, sequer sabia quem era Tim Schafer.

Entre as atrações nacionais, haviam os tradicionais YouTubers e suas performances, com destaque para  para a dupla Bruno Bock e Rolandinho (23/04), do canal Pipocando, que basicamente, realizaram uma palestra de apresentação de seu livro, lançado pela editora Novo Conceito. Mas deixo aqui uma crítica a massificação da imagem dos escritores Affonso Solano e André Gordirro, que apresentaram palestras nos três dias de evento, sendo realmente relevantes apenas  “Star Wars e o ódio por George Lucas” (21/04), mais pela diversão que esse debate proporcionou do que efetivamente pelo conteúdo; e “A influência da cultura pop na formação literária” (22/04), única para a qual os dois, ao lado de Eduardo Spohr, tinham realmente know how para debater.

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Na minha opinião, o melhor e mais relevante painel realizado no espaço aconteceu no dia 22/04: “Por trás do filme: O Rastro“, dedicado ao debate sobre cinema de gênero no Brasil e o longa de terror ‘O Rastro’, que chega aos cinemas no dia 18/05/2017, e que contou com a presença do diretor JC Feyer, o roteirista André Pereira e da produtora Malu Miranda.

Para as próximas edições, espero que o festival traga atrações mais interessantes e que seja observado o grau de relevância dos temas propostos, além da divisão maior dos temas de interesse para cada tribo do universo geek. Lembrem-se, os geeks não se resumem à fãs de jogos e a fanboys de YouTubers. A organização aqui poderia ter dedicado um pouco mais de espaço para os fãs de cinema, literatura e séries de tv, dada a escassez de atrações para esses públicos no evento, mas acertou em cheio ao dar destaque ao cinema nacional, de grande interesse para cinéfilos.

Seria interessante também aumentar a divulgação desses paineis nas próximas edições. Além da divulgação do evento em si ter sido bastante escassa, pouco se sabia das atrações que iriam passar pelo Hiker Station.

GAMER STATION

Isso sim é tratar os fãs de e-sports com o respeito que merecem. A organização aqui não poupou recursos para oferecer um espaço adequado e consideravelmente confortável, para o público que foi ao evento para acompanhar as disputas entre equipes profissionais de jogadores de Rainbow Six Siege (21/04), Counter Strike (22/04) e League of Legends(23/04), contando ainda com a cobertura oficial do SporTV.

INSTALAÇÕES

O local escolhido pelos organizadores para sediar a primeira edição da GGRF foi o centro de convenções do Riocentro, o segundo maior da América Latina, localizado em Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio de Janeiro, o que gerou uma gama de reclamações do público quanto a dificuldade de acesso ao local. Bem, no passado até entenderia esse tipo de argumento, afinal, as opções de transporte para o Rio Centro sempre foram um pouco limitadas, mas nada que impedisse o sucesso de outros eventos que há anos usam o espaço como sede, como a Bienal do Livro, a Expo Noivas e a Feira da Providência. No entanto, hoje o Riocentro conta com o acesso ao sistema do BRT, que possui uma estação localizada bem na porta do centro de convenções. O sistema é integrado com as linhas de Metrô e da Supervia, o que viabiliza o acesso de todas as partes da cidade.

O fator ‘distância’ é inegável, especialmente para quem vem das áreas centrais e sul da Cidade, além da baixada, mas bem mais acessível para públicos da zona oeste e norte, que há muito são esquecidos, ao sediarem eventos no centro de convenções SulAmérica, local indicado por muitos como o ‘ideal’. Bom, já frequentei eventos nos dois centros de convenções e, sinceramente, o SulAmérica não chega aos pés do Riocentro como espaço bem estruturado para grandes eventos. Por isso, torço para que a organização mantenha a GGRF no Riocentro.

CONCLUSÕES

A GGRF foi um festival bem organizado, uma ótima primeira edição, mas um pouco engessado no formato ‘evento’.  Há muito para se aprimorar, corrigindo problemas pontuais e erros estratégicos nas edições futuras. Os produtores ainda precisam se aprimorar e ampliar a visão do que é um público Geek. Criar mais espaços dedicados aos fãs de filmes, séries e livros, pois essa edição foi mais gamer do que geek efetivamente, dada a imensa oferta de atrações para o público gamer e poucas dedicados aos demais geeks. Os fãs de HQ foram bem menosprezados e isso ficou flagrante com a péssima localização dedicada aos artistas, no espaço ‘Art Way’, próximo a saída do evento.

Mas acredito que a GGRF tem condições de se tornar um evento muito mais relevante e, digo além, referência para o público Geek no Brasil. Basta apenas que se dedique ao festival a mesma atenção que é empregada das edições da Bienal do Livro do Rio de Janeiro.

Como diria o mestre Yoda “um futuro grande em seu caminho vejo, GGRF“!

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Nerd: Diego Cardoso

Leitor compulsivo, pseudo-cinéfilo assumidamente fã de David Lynch e do cinema nacional, além de seriador nas horas vagas. Fundador do canal Cultura & Ação, dedicado a fomentar cultura através de resenhas e críticas sobre teatro, cinema e literatura.

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